Voto-Vogal
A Senhora Ministra Rosa Weber (Presidente) : 1. Acolho o bem lançado
relatório do eminente Ministro Alexandre de Moraes , Relator.
- A despeito do pedido de vista formulado pelo eminente Ministro
Cristiano Zanin , considerando a proximidade da minha aposentadoria,
peço licença para antecipar o meu voto. - E ao fazê-lo, adianto, desde logo, que tenho ligeira divergência em
relação ao voto do Ministro Alexandre de Moraes, restrita à modulação nos
termos por ele propostos. - Rememoro que o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS após
apontar supostas omissões, no acórdão embargado, com manifesto intuito
infringente, buscou a modulação de efeitos do entendimento firmado por
esta Suprema Corte. Eis, no ponto, o teor do pedido:
“5. Modular os efeitos do acórdão embargado, de forma que ele se
aplique apenas para o futuro, excluindo-se expressamente a
possibilidade de:
a) revisão de benefícios previdenciários já extintos;
b) rescisão das decisões transitadas em julgado que, à luz da
jurisprudência dominante, negaram o direito à revisão; e
c) revisão e pagamento de parcelas de benefícios quitadas à luz e
ao tempo do entendimento então vigente, vedando-se por
consequência o pagamento de diferenças anteriores a 13.04.2023 (data
de publicação do acórdão do Tema 1.102/STF)” - Segundo a autarquia federal, até o julgamento do Tema 999 pelo
Superior Tribunal de Justiça, preponderava, na jurisprudência nacional,
entendimento que preservava a posição do INSS em limitar o período
básico de cálculo (PBC) a julho/1994, tendo havido um overruling no âmbito
dos Tribunais Superiores em favor dos segurados .
Nessa linha, assevera que, antes da tese jurídica firmada no acórdão
embargado, não havia nenhum comando normativo indicando que o
cálculo das aposentadorias desconsiderando os salários de contribuição
anteriores a julho/1994 configuravam prática ilegal ou inadequada. Por esse
motivo, todos os pagamentos realizados pelo INSS até a consagração do
entendimento pelo Supremo Tribunal Federal, estabelecendo o direito a
essa nova fórmula de cálculo, devem ser tidos como “situações plenamente
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constituídas” e, por conseguinte, segundo o art. 23 da LINDB já referido,
devem permanecer inalteradas à luz da nova orientação .
Afirma, na sequência, necessário modular os efeitos do decisum em
questão, por ter sido a manifestação do Supremo Tribunal Federal (…)
inovadora e contrária à orientação até então consolidada .
Aduz que, após 23 (vinte e três) anos de vigência da Lei 9.876/1999, esta
Suprema Corte teria alterado sua jurisprudência sobre o tema, a justificar a
necessidade de modulação.
Por fim, acentua que as rendas mensais quitadas com base no
entendimento anterior, em especial os casos de benefícios concedidos e
cessados, por configurarem atos jurídicos perfectibilizados sob o
entendimento anterior, não devem gerar direito a diferenças . - Quanto ao item a do pedido de modulação, entendo deva ser
acolhido, pelo que acompanho no tópico o voto do Ministro Alexandre de
Moraes . Isso porque, de fato, até o pronunciamento do Superior Tribunal
de Justiça, preponderava na jurisprudência dos Tribunais – à exceção desta
Suprema Corte que nunca havia apreciado esse tema específico sob o
enfoque em análise -, entendimento que placitava a conduta do INSS.
Assim, no que diz com os benefícios previdenciários já extintos, modulo os
efeitos do acórdão embargado atribuindo-lhe efeitos ex nunc . - Quanto ao item b do pedido de modulação, tenho parcial divergência
em relação ao voto do Ministro Alexandre de Moraes .
7.1. A autarquia federal, de maneira absolutamente equivocada, afirma
que esta Suprema Corte teria alterado sua jurisprudência quanto ao tema
ora em análise.
Em primeiro lugar, acentuo que, quando do julgamento das medidas
cautelares nas ADI’s 2.110/DF e 2.111/DF, ambas de relatoria do Ministro
Sydney Sanches , j. 16.3.2000, DJ 05.12.2003, o Plenário desta Corte indeferiu
o pleito.
Analisada, naquela assentada, em juízo de estrita delibação, a
constitucionalidade, em tese, dentre outros, do art. 3º da Lei 9.876/1999. No
presente recurso extraordinário, diversamente do que parece crer a parte
embargante, não foi declarada a inconstitucionalidade do dispositivo legal
apontado. Na realidade, o Superior Tribunal de Justiça analisou a questão,
mediante a concernente hermenêutica jurídica, sem, no entanto, se valer de
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argumentos constitucionais. Esta Suprema Corte, de outro lado, à luz do
direito adquirido e da correlação (referibilidade) entre a exação
previdenciária recolhida e o benefício a ser concedido ao segurado,
compreendeu que o beneficiado pode optar pela regra definitiva ou
transitória de acordo com a que lhe gere maior benefício.
Em outros termos, o art. 3º da Lei 9.876/1999 não foi declarado
inconstitucional neste recurso extraordinário, de modo que não há falar em
mudança de jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal .
Houve alteração jurisprudencial, sim, no âmbito do Superior Tribunal
de Justiça quando do julgamento do recurso especial sob o rito dos
repetitivos, mas não, repito, nesta Suprema Corte.
7.2. Entendo, diante desse contexto jurisprudencial, prudente sim
modular os efeitos do acórdão embargado, como o faz o Relator, pois, como
visto, anteriormente os Tribunais pátrios ratificavam a posição do INSS,
sendo certo que transitaram em julgado decisões com esse entendimento
proferidas em inúmeros casos submetidos ao Poder Judiciário. Adoto, no
entanto, marco temporal diverso do apresentado pelo Ministro Alexandre
de Moraes .
7.3. O INSS acentua, de forma curiosa, que a tese firmada por este
Supremo Tribunal Federal seria inovadora. No entanto, segundo atesta a
ata de julgamento, foi negado provimento ao recurso extraordinário, com a
consequente manutenção do acórdão exarado pelo Superior Tribunal de
Justiça. Ou seja, esta Casa, ao assim decidir, apenas chancelou o
entendimento do STJ.
Nesse contexto, entendo, com a devida vênia, que, a partir do
julgamento do tema pelo Superior Tribunal de Justiça, não mais subsistia
justa expectativa para a autarquia federal. A jurisprudência já havia sido
alterada pelo STJ, de modo que a conduta a ser adotada pelo INSS deveria
se pautar pelo entendimento daquela Alta Corte judiciária, notadamente em
razão dos efeitos que emanam do pronunciamento exarado sob o rito dos
recursos especiais repetitivos .
Em outras palavras, desde que publicado o acórdão do STJ ( 17.12.2019
), momento no qual alterada a jurisprudência nacional, o INSS já deveria ter
ajustado sua prática administrativa para se adequar ao pronunciamento do
Superior Tribunal de Justiça firmado sob o rito dos recursos repetitivos.
Não afasta tal conclusão o fato de ter sido manejado recurso extraordinário
e de ter sido reconhecida a repercussão geral da matéria, pois, até a
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deliberação desta Suprema Corte, a orientação vigente, oriunda do Tribunal
Superior competente, sob o rito dos repetitivos, era em sentido contrário ao
defendido pela autarquia federal.
Dito de outra forma: inexistente, em relação ao acórdão do STJ, quando
do julgamento de recurso extraordinário, quadro de mudança de
jurisprudência (ou de precedente) – reafirmada que foi com a negativa de
provimento -, inacolhível o argumento de proteção da confiança justificada.
Este tem pertinência jurídica apenas em situações nas quais a atuação da
jurisdição acarreta uma mudança brusca nas interpretações dadas a ponto
de romper com o estado de segurança jurídica consolidado, gerador de
estabilidade e previsibilidade no comportamento dos atores sociais e
jurisdicionais.
Na realidade, data venia , adotar como marco temporal a data do
julgamento do presente recurso extraordinário, significa, segundo penso,
fragilizar a autoridade do Superior Tribunal de Justiça em detrimento das
normas processuais que buscam fortalecer os pronunciamentos dessa Alta
Corte de Justiça, responsável pela uniformidade da interpretação da
legislação federal, firmados sob o rito dos recursos repetitivos.
Desse modo, tenho para mim que a modulação de efeitos deve operar
com marco ligeiramente distinto, qual seja, a contar da data da publicação
do acórdão perante o Superior Tribunal de Justiça ( 17.12.2019 ). Nessa
linha, inviável o ajuizamento de ação rescisória para a desconstituição das
decisões judiciais que transitaram em julgado até referida data, 17.12.2019,
ante a necessidade de preservar as situações jurídicas consolidadas até o
julgamento do STJ.
Por conseguinte, desde a data em referência as parcelas de benefícios
devem ser corrigidas segundo o entendimento firmado pelo STJ e
confirmado por este STF.
7.4. Anoto que inexistia pronunciamento deste Supremo Tribunal
Federal quanto ao tema específico ( revisão da vida toda ), a evidenciar a
absoluta inaplicabilidade da Súmula 343/STF e da jurisprudência
sedimentada ao exame RE 590.809/RS, Tema 136, Rel. Min. Marco Aurélio ,
Tribunal Pleno, j. 22.10.2014, DJe 24.11.2014.
Isso porque, consoante acentuei ao julgamento do ARE 1.332.413-AgRSegundo/PR, de minha relatoria , Primeira Turma, j. 21.6.2022, DJe
24.6.2022, para efeito de aplicação da Súmula 343/STF em matéria
constitucional indispensável perquirir ( i ) se a matéria era controvertida
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neste STF e ( ii ) se a decisão rescindenda estava em consonância com o
entendimento deste Tribunal à época. Assim, caso negativa a resposta para
ambos os questionamento, inaplicável o entendimento sumulado e,
portanto, cabível, em tese, a rescisória.
Faço esse registro apenas para explicitar que o fundamento da
modulação de efeitos não diz com a Súmula 343/STF e com o Tema 136,
diversamente do sustentado pelo INSS . - Em relação ao item c do pedido de modulação , assiste razão, apenas
em parte, ao embargante.
O acolhimento integral da pretensão veiculada teria o efeito de nulificar,
em parte, o decisum do STJ e do STF, prejudicando todos aqueles que
recorreram, de forma legítima, ao Poder Judiciário e pautaram sua conduta
na prevalência de julgamento do Superior Tribunal de Justiça sob o rito dos
repetitivos.
Como acentuei acima, desde 17.12.2019 , o INSS já tinha uma sinalização
clara do Poder Judiciário, sua conduta, desde então, não estava amparada
na interpretação conferida pelo STJ às normas aplicáveis.
Nada obstante, dada a alteração jurisprudencial ocorrida no âmbito do
STJ , a partir do julgamento do recurso especial sob o rito dos recursos
repetitivos, entendo, por razões de segurança jurídica, necessário proceder à
modulação de efeitos, de modo a impedir a cobrança da diferença de
valores anteriores à data de publicação do acórdão do STJ ( 17.12.2019 ).
Na esteira da jurisprudência desta Suprema Corte, compreendo
indispensável, de outro lado, ressalvar, quanto ao item c , dos efeitos da
modulação os processos ajuizados até a data do início ( 26.6.2019 ) do
julgamento de mérito do recurso especial (REsp 1.554.596/SC) sob o rito dos
repetitivos (ADI 5.469/DF, Rel. Min. Dias Toffoli , Tribunal Pleno, j.
24.02.2021, DJe 25.5.2021; RE 574.706-ED/PR, Rel. Min. Cármen Lúcia ,
Tribunal Pleno, j. 13.5.2021, DJe 12.8.2021; ADI 6.145-ED/CE, de minha
relatoria , j. 18.3.2023, DJe 28.3.2023, v.g. ). - Ante o exposto, acolho, em parte, os Embargos de Declaração,
unicamente para modular os efeitos da tese fixada no Tema 1002, mas, – e
aqui divergindo em parte, com a mais respeitosa vênia, do Ministro
Alexandre de Moraes -, voto, nesta modulação, para que se exclua do
entendimento fixado no Tema 1102 a possibilidade de: ( i ) revisão dos
benefícios previdenciários já extintos; ( ii ) ajuizamento de ação rescisória,
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com fundamento na tese firmada neste recurso extraordinário, contra
decisões que tenham transitado em julgado antes de 17.12.2019 ; ( iii )
pagamento de diferença de valores anteriores a 17.12.2019 , ressalvados os
processos ajuizados até 26.6.2019 .
É o meu voto .